- Desde 2015, o CBD deixou de ser proibido no Brasil e passou a ser um medicamento controlado. Em 2019, a Anvisa publicou a RDC 327/2019, regulamentando a fabricação, importação, comercialização e prescrição de produtos à base de cannabis.
- Os produtos são divididos em dois tipos: medicamentos (com exigência de estudos clínicos) e produtos de cannabis (com exigências mais simples). Apenas um medicamento (Mevatyl®) foi registrado; 36 produtos têm autorização sanitária.
- A Anvisa propõe ampliar vias de administração, permitir manipulação em farmácias com pureza mínima, controlar o teor de THC, regular publicidade e atualizar critérios de rotulagem, qualidade e rastreabilidade dos produtos.
- A Consulta Pública nº 1.316/2025 encerrou em junho e agora passa por análise técnica das contribuições. A nova norma será submetida à Diretoria da Anvisa antes de entrar em vigor, visando atualizar e aprimorar o marco regulatório atual.
Evolução normativa da cannabis medicinal no Brasil
A partir desse reconhecimento inicial, tornou-se necessário desenvolver uma estrutura regulatória mais ampla e específica para garantir segurança sanitária, padronização dos produtos e acesso qualificado.
Em resposta a essa demanda crescente, em 2019, a Anvisa publicou a Resolução RDC nº 327, que passou a regulamentar de forma sistematizada a fabricação, importação, comercialização e prescrição de produtos à base de cannabis para fins medicinais.
Desde então, esses produtos passaram a ser enquadrados em duas categorias distintas:
- Medicamentos à base de cannabis: exigem estudos clínicos rigorosos, comprovação de eficácia, segurança e qualidade farmacêutica, conforme os critérios tradicionais aplicados a medicamentos no Brasil;
- Produtos de cannabis: seguem um rito de regularização simplificado, com foco na qualidade e estabilidade do insumo, mas sem necessidade de comprovação clínica de eficácia, sendo autorizados por meio de autorização sanitária específica da Anvisa.
Atualmente, apenas um medicamento está registrado oficialmente no país: o Mevatyl®, um spray oral que combina CBD e THC, indicado para pacientes com esclerose múltipla.
Além dele, cerca de 36 produtos de cannabis já foram regularizados com base na RDC 327/2019, estando disponíveis em farmácias mediante prescrição médica.
Esse cenário demonstra não apenas o crescimento da demanda por alternativas terapêuticas à base de cannabis, mas também o avanço progressivo do marco regulatório, que busca equilibrar acesso seguro, controle sanitário e inovação na área da saúde.
Construção coletiva da nova regulamentação
Em 2025, a Anvisa deu mais um passo na consolidação da política nacional sobre cannabis medicinal ao abrir a Consulta Pública nº 1.316/2025, com o objetivo de revisar a Resolução RDC nº 327/2019, que atualmente regula a fabricação, comercialização e prescrição de produtos à base de cannabis no Brasil.
A realização da consulta pública é fundamental para garantir que as decisões regulatórias sejam mais transparentes, participativas e alinhadas com as demandas reais da população brasileira. Ao considerar experiências clínicas, evidências científicas atualizadas e necessidades práticas, a Anvisa fortalece a legitimidade e a efetividade da regulamentação.
Além disso, o debate aberto com a sociedade representa uma oportunidade concreta para corrigir lacunas da legislação vigente, ampliar o acesso com segurança e promover o uso ético e responsável dos produtos à base de cannabis no Brasil.
Principais mudanças propostas pela Anvisa
Os principais pontos apresentados na Consulta Pública nº 1.316/2025 são os seguintes:
1. Ampliação das vias de administração
Atualmente, a regulamentação permite apenas o uso pelas vias oral e nasal. A nova proposta amplia esse leque, incluindo as vias:
- Bucal
- Sublingual
- Inalatória
- Dermatológica
A ampliação visa contemplar diferentes necessidades clínicas e perfis de pacientes.
2. Manipulação em farmácias
Propõe-se autorizar que farmácias de manipulação possam produzir preparações com fitofármaco de CBD, desde que apresentem pureza mínima de 98% em base anidra.
Essa medida busca ampliar o acesso, possibilitar alternativas individualizadas e promover a redução de custos, mantendo o padrão de qualidade exigido pela Anvisa.
3. Importação e produção de insumos
A proposta autoriza a importação de canabidiol e produtos a granel para fins de pesquisa, desenvolvimento e fabricação de medicamentos. No entanto, continua vedada a importação direta do fitofármaco por farmácias de manipulação, com o intuito de preservar o controle sobre a origem e a qualidade dos insumos utilizados.
4. Regras para publicidade e rotulagem
A nova redação prevê a liberação da publicidade dos produtos à base de cannabis, desde que direcionada exclusivamente a profissionais de saúde prescritores. As informações devem estar estritamente alinhadas à bula e rotulagem aprovadas.
A proposta também estabelece requisitos para controle de qualidade, inviolabilidade da embalagem, rastreabilidade e monitoramento pós-comercialização.
5. Limite de THC em produtos
Produtos com teor de THC superior a 0,2% serão restritos a pacientes com condições médicas graves ou debilitantes, exigindo justificativa clínica e controle mais rigoroso. Essa limitação visa evitar usos indevidos e reforçar a segurança terapêutica.
6. Critérios para transição regulatória
Permite-se que empresas mantenham ou renovem a Autorização Sanitária para produtos que ainda não tenham sido registrados como medicamentos. Estabelecem-se prazos específicos para adequações:
- 90 dias para atualização de rótulo e folheto;
- 180 dias para implementação das mudanças exigidas.
Entenda por que essas mudanças estão sendo propostas
A Resolução RDC nº 327/2019 foi elaborada como uma regulamentação transitória, com o objetivo de atender, de forma rápida, à crescente demanda por produtos de cannabis medicinal no Brasil. Seu prazo inicial de cinco anos foi concebido para permitir que os fabricantes se adequassem e avançassem no processo de registro definitivo como medicamento.
No entanto, passados esses anos, muitos produtos ainda não foram registrados, e a norma atual já apresenta limitações práticas — tanto na diversidade de formulações disponíveis, quanto nas exigências para comercialização e acesso.
A proposta de revisão é motivada pela necessidade de aprimorar o marco regulatório, com base em evidências técnicas, demandas clínicas e sugestões da sociedade, reunidas desde 2022 por meio do processo E‑Participa e do Relatório de Análise de Impacto Regulatório (AIR) conduzido pela Anvisa.
Quais serão os próximos passos após a consulta pública
Com o encerramento da Consulta Pública nº 1.316/2025, no dia 2 de junho de 2025, a Anvisa iniciou a etapa de análise técnica das contribuições recebidas. Essa fase é fundamental para a consolidação da nova regulamentação e compreende as seguintes etapas:
- Compilação das manifestações: a agência reúne todas as contribuições enviadas por profissionais da saúde, associações de pacientes, pesquisadores, representantes do setor regulado e demais interessados da sociedade civil;
- Avaliação técnica das propostas: cada sugestão é analisada com base em critérios como evidências científicas, viabilidade regulatória, segurança sanitária e impacto sobre a saúde pública;
- Elaboração da versão final da norma: considerando as contribuições pertinentes, a equipe técnica poderá revisar e ajustar o texto da minuta da nova resolução;
- Submissão à Diretoria Colegiada (Dicol): a proposta final será submetida à votação pelos diretores da Anvisa. Se aprovada, a nova regulamentação será publicada no Diário Oficial da União e passará a vigorar na data que for definida pela própria norma.
Embora não exista um prazo exato para a publicação da nova resolução, o trâmite costuma levar alguns meses após o encerramento da consulta pública — especialmente quando se trata de temas complexos ou com grande volume de participações, como é o caso da cannabis medicinal.
Considerações finais
A revisão da RDC nº 327/2019 representa um passo decisivo na construção de uma política pública mais estruturada, segura e inclusiva para o uso medicinal da cannabis no Brasil. Ao promover uma atualização normativa pautada em critérios técnicos e na escuta social, a Anvisa sinaliza seu compromisso com uma regulação que equilibre inovação terapêutica, responsabilidade sanitária e acesso qualificado à saúde.
À medida que novas evidências científicas se acumulam e a prática clínica avança, torna-se imprescindível que o marco regulatório acompanhe essas transformações, sem perder de vista a proteção dos pacientes, a qualidade dos produtos e a transparência do processo regulatório.
Estamos diante de um momento de transição e amadurecimento institucional, em que diálogo, participação social e informação qualificada são elementos essenciais para consolidar avanços. Estar bem informado e acompanhar os próximos desdobramentos é fundamental para todos os atores envolvidos nesse cenário em evolução.



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